por Redação MundoMais
Quarta-feira, 19 de Junho de 2024
Você já deve ter se esbarrado com um dos recentes virais da internet: os vídeo de agradecimento sem voz da modelo e apresentadora Maya Massafera. Os seguidores já até contabilizaram: sete beijos com a mão direita, seis beijos com as duas mãos, oito corações com as unhas batendo e um último beijo com as duas mãos.
7 beijos com a mão direita
— bro-nu (@bronubronu) June 17, 2024
6 beijos com as duas mãos
8 vezes fazendo coração
1 beijo final com as duas mãos pic.twitter.com/gpEUVKy5PX
O vídeo, que virou meme nas redes sociais e vem sendo reproduzido inclusive pela própria Maya, estourou após a influenciadora não mostrar como está a sua voz desde que realizou as cirurgias de afirmação de gênero. Mas isso possui um motivo já explicado pela modelo: a disforia de voz.
A fonoaudióloga Karla Tolentino explica que a disforia de voz " é uma condição na qual a pessoa experimenta desconforto ou insatisfação com sua própria voz". No caso de pessoas trans, a condição pode se "manifestar frequentemente pela não identificação entre a voz percebida e a identidade de gênero, levando muitas vezes ao sofrimento emocional e podendo ocasionar atrasos no processo de transição."
A desconexão com a voz pode fazer com que pessoas trans não reconheçam sua voz como adequada. Isso faz com que a comunicação da pessoa seja prejudicada, pois ela tende a se privar de falar em público devido à incongruência entre sua voz e sua identidade de gênero. "Quando a disforia ocorre, muitas pessoas podem sofrer com baixa autoestima, se privar de interações interpessoais, adquirir ansiedade e fobias sociais, além de depressão e risco de automutilação", explica Karla.
A voz como percepção de gênero
Segundo a especialista, a voz é um dos principais pontos que são levados em consideração na identificação de um gênero em sociedade. Ainda que a pessoa não esteja presente visualmente, como em uma ligação, um sujeito é capaz de inferir e atribuir um gênero a outro sujeito através da fala: "Logo, quando uma pessoa trans percebe uma convergência entre a voz que emite e a voz esperada do gênero com o qual se identifica, cria-se sentimentos de aceitação, reconhecimento social e autoconfiança", explica Karla.
O fonoaudiólogo João Lopes completa: "Muitas mulheres trans buscam tratamento vocal, seja por meio de cirurgia ou fonoterapia, para se adequar aos padrões cisnormativos de gênero e adquirir características que tragam uma identidade social, ou seja, a passabilidade. Portanto, o trabalho vocal é voltado para a inserção dessas mulheres na sociedade e para o reconhecimento público da nova qualidade de sua voz."
Tratamento de disforia de voz
João ressalta que o tratamento para disforia da voz deve, antes de mais nada, ser acompanhado de um psiquiatra e de um psicólogo. "A fonoterapia por si só não é suficiente para sanar a disforia de voz."
Os especialistas explicam que existe uma falsa impressão de que para uma voz ser masculina ou feminina ela precisa apenas de uma frequência específica, seja ela mais grave ou mais aguda.
"Inicialmente, são realizados exercícios vocais para aumentar a flexibilidade e o alcance das notas agudas, proporcionando uma voz mais adequada. Na segunda parte do tratamento, trabalha-se a prosódia, ou seja, a comunicação como um todo. Isso inclui a articulação, gestual das mãos, expressões faciais e postura. Todos esses aspectos contribuem para que a voz tenha uma maior relação com a identidade de gênero da pessoa", afirma João.
Entretanto, a Karla ressalva que mesmo realizando a fonoterapia, a estrutura anatômica do paciente pode ser um fator impeditivo do completo sucesso. "Quando essa situação ocorre, o ideal é que haja uma conversa entre paciente, fonoaudiólogo e cirurgião para chegarem a um consenso e indicar a cirurgia."
Entre as técnicas voltadas para deixar a voz mais aguda, estão a diminuição da área vibratória da prega vocal, responsável pela emissão do som, e uma cirurgia em que o médico atua na cartilagem tireoide para obter o resultado.
João ressalta que, mesmo com um procedimento mais invasivo como a cirurgia, é necessário um acompanhamento pré e pós-cirúrgico para que o resultado seja mais efetivo.
Caso Maya Massafera
No X, antigo Twitter, Maya recentemente lamentou uma ameaça de expor a sua voz: “Espero que seja mentira isso! Eu aprendi a entrar na brincadeira e até estou achando engraçado. Mas eu tenho disforia da voz que estou e não é questão de gostar. É questão de chorar, ficar mal, não querer sair de casa. E se for verdade, essa pessoa pagaria por um crime”.
A apresentadora voltou a se manifestar sobre o assunto em seu perfil do Instagram: “Me diz que é mentira, gente… Isso é bem sério”. Ela também disse que não é a primeira vez que passa por esse tipo de situação: “Isso já aconteceu uma vez. Foi na época em que eu ainda não tinha assumido minha transição. Foi em um hospital que eu tinha ido. A Justiça resolveu e tive a ajuda do hospital para identificar a pessoa”, contou. “Existe muita gente ruim nesse mundo. Infelizmente. Crime tem que ser tratado como crime. Minha vida e saúde física e mental não são brincadeira e não estão à venda”, acrescentou Massafera.