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Mulheres trans ressignificam turismo e história na capital federal

Iniciativa da Casa Rosa e ONGs internacionais capacita cinco mulheres para guiarem roteiros que unem pontos turísticos a suas vivências, oferecendo nova inserção profissional e combatendo o preconceito.

por Redação MundoMais

Quinta-feira, 26 de Junho de 2025

Em um movimento que une turismo, memória e inclusão, a capital federal se prepara para ser vista sob uma nova perspectiva. O projeto “Trans Histórias Brasília” está capacitando cinco mulheres trans e travestis para se tornarem facilitadoras de roteiros urbanos que entrelaçam a história oficial da cidade com suas próprias trajetórias de vida e resistência. Com estreia prevista para julho, a iniciativa busca ocupar espaços simbólicos e criar novas oportunidades profissionais.

Realizado em uma parceria entre o espaço de acolhimento Casa Rosa, a ONG internacional Sama Sama e a Conscious Travel Foundation, o projeto selecionou Amanda Costa (24), Bebel Mendonça (60), Layla Rosas (43), Lorraine Macedo (56) e Nathália Vasconcelos (34) para a primeira turma. Elas conduzirão passeios por pontos emblemáticos como o Palácio do Itamaraty, a Feira da Torre de TV e a Praça dos Orixás, oferecendo uma narrativa que vai além da arquitetura e da política.

“Mesmo tendo nascido em Brasília, eu não tinha tanto conhecimento sobre determinados lugares. Foi só ao iniciar esse projeto que percebi o quanto também me era negado o direito à cidade”, relata Bebel Mendonça, de 60 anos. “O turismo sempre foi um universo distante. Agora, é uma ferramenta de transformação pessoal e coletiva.”

Dignidade e inserção profissional

Mais do que uma simples capacitação, o projeto oferece uma estrutura robusta de apoio. As participantes recebem uma bolsa de incentivo de R$ 4.950 para garantir sua permanência durante as oficinas teóricas e práticas, que ocorrem aos fins de semana. A iniciativa conta ainda com uma rede de parceiros que fornecem alimentação e suporte logístico.

Para Lorraine Macedo, de 56 anos, que por muito tempo comandou a noite LGBTQIA+ de Brasília, o projeto representa um novo capítulo. “Durante muito tempo, travestis foram vistas como símbolos de marginalidade. Estar nesse projeto é viver um novo tempo. A gente está aqui, buscando fazer o melhor, com dignidade, com força”, afirma.

A proposta se destaca por oferecer uma porta de entrada em um setor profissional raramente acessível para a comunidade trans, quebrando um ciclo de oportunidades restritas a áreas como beleza ou culinária. “Turismo é algo raro, e isso muda tudo. Estou aprendendo algo novo, que pode me dar retorno e abrir caminhos que nunca imaginei”, comemora Nathália Vasconcelos, de 34 anos.

Um modelo de futuro

Inspirado em projetos internacionais como o Unseen Tours, de Londres, que capacita pessoas em situação de rua, o “Trans Histórias Brasília” busca não apenas gerar renda, mas também reeducar a sociedade. “É um respiro. Uma chance real. Há décadas que não víamos algo assim sendo oferecido para a nossa comunidade, principalmente para pessoas adultas trans”, pontua Pedro Matias, coordenador da Casa Rosa.

Para ampliar o debate, o projeto promoverá em julho painéis abertos ao público com representantes da Embratur e do Ministério do Turismo, discutindo como tornar o turismo brasileiro mais inclusivo. Para as participantes, no entanto, a maior transformação já está acontecendo.

“Cada rua que a gente pisa é uma afirmação de que pertencemos”, conclui Bebel. “Estamos conquistando, uma a uma, as portas que sempre estiveram fechadas pra nós. E não vamos parar por aqui.”