por Redação MundoMais
Terça-feira, 07 de Maio de 2019
Está em cartaz no teatro Viga Espaço Cênico, em São Paulo, o monólogo “De Volta a Reims”. Não é somente a narrativa de um homossexual, a peça também aborda a diferença entre classes sociais e ideologias políticas.
O monólogo interpretado por Pedro Vieira é inspirado no livro homônimo do filósofo francês Didier Eribon, que narra seu retorno depois de trinta anos à cidade natal de Reims, no nordeste da França, e seu reencontro com a mãe. O acontecimento que marcou sua volta é a morte do pai, com quem ele nunca teve diálogo e que nunca compreendeu sua homossexualidade.
Didier tenta através da narrativa entender a si próprio e o que o levou a abandonar a pequena cidade e a família inteira e se mudar para Paris. O mesmo drama é vivido por muitos homossexuais no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Deixar para trás a cidade natal e procurar a cidade grande é a saída normalmente encontrada para escapar dos olhos acusadores de familiares a amigos. E não é só a fuga da cidade e das origens. A busca de ascensão social vivida por muitos gays é a forma de negar todo o passado e de não querer mais fazer parte daquele mundo que foi opressor na sua infância e adolescência. Ele reflete, no entanto, que apesar de ter que aprender um novo jeito de falar, mudar o sotaque e aprender novas formas de se comunicar e se comportar, nada disso jamais mudou suas raízes, quem ele realmente é e de onde ele veio, por mais que ele tente negar tudo isso.
No começo da história ele diz que foi melhor não ir ao enterro do pai e cita James Baldwin ao dizer que “uma das razões pelas quais as pessoas se apegam tanto aos seus ódios é que elas de alguma forma sabem que uma vez que o ódio desaparece, elas serão forçadas a lidar com a dor”. E continua dizendo: “Eu disse para minha mãe que eu não queria vê-lo porque eu o odiava. Mas não era verdade. O fato é que eu o havia odiado e queria continuar me agarrando a esse ódio. Eu não queria olhar a sua ruína. Porque não era aquela ruína que eu havia odiado.”
O interessante deste monólogo é que Pedro Vieira inclui na narrativa suas experiências de vida pessoais, falando de si próprio e de sua trajetória com origem no nordeste do Brasil, mostrando fotos de sua infância e de sua família e interagindo com a platéia.
O espectador gay certamente vai se identificar com diversas passagens desse relato e vai sair do teatro com aquela sensação de quando se sai de uma sessão de terapia: são situações que todos certamente já viveram de um modo ou de outro, que estiveram lá dentro o tempo todo, mas que a narrativa traz à tona e nos faz refletir sobre nosso próprio comportamento. Não é algo novo, mas é algo sobre o qual nunca paramos para pensar.
Pedro Vieira foi indicado ao Prêmio Shell em 2016 com o espetáculo "Eu tenho tudo". De Volta a Reims tem direção de Cácia Goulart e texto de Reni Adriano.
SERVIÇO:
Viga Espaço Cênico. Rua Capote Valente, 1323, Pinheiros (SP). Sexta e sábado, 21h; domingo, 19h. R$ 30,00. Até o dia 26 de maio. Ingressos online no site Sympla ou na bilheteria do teatro.
Livro disponível em inglês na Amazon Brasil “Returning to Reims”, como eBook Kindle.